Recebi em meu escritório um casal de candidatos à aquisição de uma franquia da qual represento o departamento jurídico e, como sempre, no início de tudo, minha preocupação é aproveitar esse primeiro encontro para extrair ao máximo, informações e percepções que me permitam criar algum tipo de convicção a respeito daqueles que acabei de conhecer, até para perceber se são candidatos com ética ou não.
Difícil missão essa. Definir quem não se conhece. Determinar pelo breve contato se aquele “perfil” condiz com a proposta do franqueador que represento, se aquele “tipo” de pessoa (como se fosse possível em um breve encontro definir isso) se adequará ao “tipo” de negócio que é desenvolvido pela rede de franquias a que pretende se unir.
Sem dúvida é difícil, mas a experiência de anos desenvolvendo este tipo de trabalho, desenvolvendo critérios que aguçam de alguma forma este tipo de percepção, nos faz ir direto ao ponto e buscar no cerne das pessoas que se apresentam, exatamente aquilo que precisamos extrair delas nesse primeiro encontro.
Logicamente, não há receita de bolo e erros acontecem. Alguns de fato aparentam o que não são. Alguns se tornam grandes decepções e, na mesma proporção, outros são gratas surpresas.
Entretanto, conversando com esse casal que, nem de longe, corresponde ao “perfil” normal dos candidatos que normalmente se apresentam interessados em adquirir um negócio e o know how de outrem, encontrei duas pessoas bem formadas e profundas conhecedoras do mercado que pretendem ingressar.
Não necessariamente do segmento da rede que estão se candidatando, mas sim do mercado de franquia como um todo. A certa altura me confidenciaram já terem se aventurado na condição de master franqueados regionais de uma rede que, infelizmente, passou longe de ser uma experiência de sucesso.
Fora toda a conversa que foi muito agradável e extremamente proveitosa para o feedback que a franqueadora espera de mim, não pude deixar de aproveitar também a experiência que aquelas pessoas tinham a me oferecer.
Aliás, diariamente procuro fazer isso. Procuro extrair de todas as oportunidades que se apresentam algum tipo de experiência, seja ela boa ou ruim. E nesse mercado de franquias se lida com vários tipos de pessoas, com vivências e pensamentos diferentes e, obviamente, sempre se tem muito a aprender.
Em especial nesse encontro, o que me chamou a atenção foi o conceito que eles têm de negócios. Segundo eles, existem atividades que são “investimento intenso”. Ou seja, atividades nas quais o cerne do sucesso está no investimento, no capital, dinheiro aplicado e no retorno que ele pode dar. Só se contabiliza isso, só se conta com isso. São as atividades que independem da qualidade dos seres humanos envolvidos e que têm a ver com mercado, com oferta e procura, com variações de moeda etc.
Outros negócios, com os quais confesso que me identifico mais, até pelo trabalho que desenvolvo, eles denominaram como “ética intensa”, onde ao contrário do outro, é ela que vai determinar, no fim das contas, o sucesso ou não do investimento. Ou seja, embora da mesma forma haja a necessidade de aporte financeiro e claro expectativa de seu retorno, é a ética da contratação que fará toda a diferença.
Segundo eles, um bom contrato sem ética nada vale. E franquia é pura ética. Sim, pois, investir em uma atividade onde o modo de conduzir os negócios depende em grande escala da outra parte contratante, sem dúvida, exige ética. Exige ética para cumprir as obrigações contratadas. Exige ética para perceber o desequilíbrio da relação caso venha a ocorrer. Exige ética para fazer valer o conceito de parceria que, no fundo, é o que se está contratando ao assinar um contrato de franquia. Exige ética para manter uma correta e constante avaliação quanto aos rumos da rede e o retorno de seus franqueados. Exige ética permanente.
Do outro lado também não é diferente. Da mesma forma que espera-se ética do franqueador, espera-se ética do franqueado. Para cumprir suas obrigações e, sobretudo, para bem representar na ponta, a marca que irá ostentar durante todo o relacionamento contratual.
A bem da verdade, depois do investimento inicial e maturação do negócio, com a formação da clientela e reconhecimento do público local, o que mais importará será a qualidade da contratação efetuada. Assim, se o negócio é bom e o ponto foi bem escolhido, só resta às partes seguirem os conceitos que nortearam a união entre elas durante todo o prazo do contrato para que tudo corra como esperado.
Portanto, num relacionamento de franquia, “ética intensa” nunca será demais.