Empresas Familiares.
Comecei a minha vida e experiência no segmento de franquia em uma empresa familiar, na qual todas as decisões eram tomadas com grande influência emocional. Muitas questões práticas que poderiam ser resolvidas objetivamente, se estendiam e se transformavam em problemas maiores porque a emoção falava mais alto e era muito difícil não levarem “para o pessoal” críticas e situações que poderiam ser resolvidas com definições profissionais, planos de ação bem definidos ou simplesmente pela experiência de gestores contratados com a única finalidade de gerir empresas.
Não podemos generalizar e, por óbvio, muitas empresas familiares têm administração profissional e não deixam as rédeas do negócio serem comandadas pela emoção, mas ainda hoje me deparo com a administração que conheci há mais de vinte anos, na qual a tomada de decisões é contaminada por altas doses de emoção.
A crise, o aumento da concorrência em todos os segmentos, a escassez de recursos, a pesada carga tributária e todos os problemas que enfrentamos em nosso país exigem uma maior capacidade de reinventar, inovar, gerir profissionalmente e destinar as receitas e as energias para o que realmente importa. Isso vem modificando o pensamento e a forma de atuar de toda e qualquer empresa.
Assim, empresas familiares, percebendo a necessidade de uma administração profissional para assegurar o crescimento, estão indo ao mercado em busca de executivos com bagagem e experiência em outras corporações para somar, compartilhar boas práticas e implementar políticas de gestão objetivas, com foco nos resultados da rede como um todo.
Ocorre que, em franquia, o que faz a diferença no êxito do franqueado é, na maioria das vezes, o nível de engajamento e pertencimento que o franqueador consegue despertar nele. Nas redes comandadas por estruturas familiares, esse pertencimento se origina de relações pessoais iniciadas com os “donos”, com a família que representa aquela marca. Com a implementação de uma gestão profissional, o afastamento da “família”, dos “donos” do dia-a-dia a relação com os franqueados pode ser traumático.
As antigas gestões familiares, baseadas na emoção, podem ter deixado vícios, marcas e desgastes na relação com a rede da franquia. O gestor profissional, ou o executivo contratado, não pode entrar para o negócio sem considerar o “ranço” de anos desse relacionamento quase pessoal.
Tenho visto, em diversas empresas, executivos que são contratados e, diante de uma rede “ressentida” pelas dificuldades e por anos de uma administração familiar, acabam se voltando para dentro e para frente, desprezando a história que cada franqueado desenvolveu com a rede em anos de relação.
É difícil entrar em relações já construídas, em ressentimentos instaurados e tentar “vender” o novo, a prosperidade e uma visão positiva do futuro. Mas, demonstrar que se tem essa intenção é essencial para seguir em frente. Profissionalizar é fundamental para crescer, para suportar e ultrapassar o atual momento da nossa economia, mas conquistando o apoio e o voto de confiança da rede pode ser mais fácil.
E como fazer isso? Como entrar numa rede formada em sua maioria por franqueados acostumados a lidar diretamente com os “donos” para resolver todas as questões?
– Fazendo com que o “dono” participe ativamente do deslocamento da autoridade, fazendo com que ele, sistemática e gradativamente, vá repassando à sua equipe o processo de tomada de decisão. Ele não deixa de atender seus franqueados. Não se torna, de repente, uma pessoa inacessível. Ele continua recebendo as demandas e repassando aos seus subordinados, sem NUNCA passar por cima das decisões tomadas por eles, para não os desautorizar perante a rede da franquia. Assim, aos poucos, os próprios franqueados saberão que é mais rápido e eficaz falar direto com o responsável pelo assunto do que demandarem o “dono”;
-Ouvindo a rede. Os profissionais contratados têm que dedicar um tempo da agenda para visitar e ouvir a rede. Vão estreitar a relação e ouvir reclamações? CLARO! Mas formarão seu próprio convencimento em relação às pessoas dos franqueados, porque o desgaste e o ressentimento existem dos dois lados, e conhecer as verdades dos outros pode lhes fazer entender melhor o desenrolar dos anos de relacionamento. Não é a visão de quem está na empresa (já envolvido por um relacionamento quase “pessoal”) que norteará as novas decisões, e sim o conhecimento e a percepção de quem chegou para ser objetivo, pontual, e acima de tudo profissional na gestão da rede;
– Comunicando, compartilhando e alinhando as expectativas. É importante deixar bem claras a finalidade e a intenção da franqueadora com a mudança na gestão e quais são as expectativas para o futuro da empresa a partir das modificações implementadas.
Resumindo
Transparência no processo e pés no chão nos projetos de futuro, considerando que todos que já fazem parte do negócio, conhecem muito bem as limitações da rede e que não será possível transmutá-las completamente logo de cara.
Quem acaba de entrar não pode desprezar a história de quem já está lá. Trabalhar, mudar, crescer e inovar com o apoio da rede deve ser o objetivo. Por isso conquistá-la, ou pelo menos tentar, deve ser o foco inicial.